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PREÂMBULO

Este artigo tem o propósito de apresentar o pensamento da equipe de saúde do CHECKUP EXECUTIVO BAÍA SUL, a sua visão sobre a saúde, seus problemas e desafios atuais, bem como apresentar embasamento teórico e prático sobre as condutas que propõe para a implantação de ações de Prevenção da Saúde.

Esta visão é resultante de anos de prática clínica nutricional, do acompanhamento da evolução das condições de saúde de seus pacientes, muitas vezes negativas, sem explicação razoável, o que levou à equipe do Checkup Executivo Baía Sul questionar fortemente os índices aplicados para avaliar os fatores de risco dos pacientes sob seus cuidados. O resultado foram intensos estudos que geraram a proposição da criação de um ranking ou gradação no nível de saúde, como um selo que indicasse o estágio do paciente na manutenção da saúde plena, ou, pensando de forma inversa, qual o degrau em que o paciente se encontra na progressão para chegar nas aparentemente inevitáveis doenças crônicas não transmissíveis. A partir desta avaliação, sabedores das deficiências do paciente, à equipe de saúde caberia sugerir os caminhos para o paciente recuperar ou manter a condição de saúde ideal, dentro da ótica da Saúde Preventiva.

A ideia de fundo do checkup era, e continua sendo, avaliar precocemente as condições que podem vir a impactar na saúde de cada um, sejam de fundo fisiológico, psicológico ou ambiental, de forma que se possam sugerir correções eficazes a nível individual.

Evidencia-se neste processo a importância da nutrição na manutenção da saúde. Este assunto é aqui tratado em detalhe, bem como se apresenta, e fundamenta, a adoção de uma linha de conduta que seguramente causa estranheza, por divergir fortemente do que poderia ser entendido por alimentação saudável, a ouvir o que pregaram os entendidos no decorrer dos últimos setenta e tantos anos.

EXPECTATIVA DE VIDA E DA SAÚDE

Quando se fala em expectativa de vida para os seres humanos no mundo, é inegável o enorme ganho ocorrido nos últimos 120 anos. Em 1900 a expectativa de vida era de 30 a 35 anos. Atualmente é da ordem de 72 anos. Claro, estamos falando em média mundial (1). Em alguns países da Europa e Oceania chega a 85 anos. Apesar da expectativa de vida ser de 47 anos para um homem branco em 1900 nos Estados Unidos, 12% deles chegariam aos 65 anos e 4% aos 85 anos. Números semelhantes são estimados para a humanidade na Antiguidade, ou mesmo na Idade da Pedra, tanto por registros escritos no primeiro caso, quanto por pesquisa arqueológica no segundo caso.

O aumento da expectativa de vida no último século está diretamente relacionado aos avanços da medicina: vacinas, vitaminas, sulfa, antibióticos, marca-passo, stents, evolução de técnicas cirúrgicas e diagnóstico por equipamentos. Todas foram contribuições marcantes. A queda da mortalidade infantil, outro fator importante, era 165 mortes em 1900 e é atualmente de 14 mortes por mil crianças entre 0 e 5 anos, no Brasil.

Agora, quando se fala de expectativa de vida saudável, ou expectativa de saúde, a coisa muda. O ganho em expectativa de vida veio pelo controle das doenças infecciosas e pelo desenvolvimento da medicina em técnicas para prolongar a vida de pessoas com doenças não transmissíveis, normalmente em idade mais avançada. A expectativa de vida saudável, ou seja, o tempo que uma pessoa vive até apresentar uma doença crônica, entretanto, não tem mostrado evolução nas últimas décadas, ao contrário. Os esforços da medicina deveriam se concentrar, agora, no adiamento do surgimento das doenças crônicas não transmissíveis nas pessoas, normalmente desabilitantes em seu decurso (2, 3). Observa-se no mundo atual uma verdadeira pandemia de obesidade e diabetes tipo 2, com prevalência progredindo para pessoas com idade menos avançada a cada ano.

As duas maiores causas de morte no mundo, doenças cardíacas e câncer, estão relacionadas com doenças metabólicas crônicas. Também relacionadas estão as doenças cerebrovasculares, mal de Alzheimer e diabetes tipo 2 (4). Embora não pareça, todas estas doenças têm uma coisa em comum. Em graus variáveis, a resistência à insulina está na raiz do problema ou o está agravando (5).

A IMPORTÂNCIA DA INSULINA NA SAÚDE

Estima-se que 88% dos norte-americanos têm resistência à insulina (6). No Brasil não existem estudos específicos, mas, se consideramos que as pessoas com sobrepeso têm, invariavelmente, algum grau de resistência à insulina, acima de 60% dos brasileiros devem ter resistência à insulina.

A insulina é um hormônio fundamental para o funcionamento do nosso corpo. Fabricada no pâncreas, é uma proteína que tem por função mais importante regular a concentração de glicose no sangue. Quando ingerimos alimentos que elevam a glicose no sangue, a insulina “abre as portas das células” para que as células de todas as partes do corpo, como cérebro, coração, músculos e tecido adiposo, recebam glicose e a processem. Além de regular a glicose no sangue, a insulina influencia cada célula, em cada tecido do corpo. O efeito específico da insulina depende da célula. Por todo o corpo, a insulina regula como uma célula usa a energia, influencia no tamanho da célula, na produção de outros hormônios, e mesmo determina se uma célula deve morrer ou permanecer viva. Um efeito comum em todas as células é a habilidade da insulina promover a produção de moléculas maiores a partir de moléculas menores, processo conhecido como anabolismo. Insulina é um hormônio anabólico (5). A resistência à insulina ocorre quando as células oferecem menor resposta ao hormônio insulina. Esta insensibilidade, como ocorre na maioria dos ciclos hormonais, é gerada pela própria presença de altos níveis de insulina no sangue. Várias condições podem levar à resistência à insulina: a idade, a genética, processos inflamatórios, stress oxidativo e fatores relacionados ao estilo de vida. Quando falamos em estilo de vida, incluímos fatores que dependem do lugar onde vivemos, como a qualidade do ar que respiramos, as coisas que comemos e as coisas que fazemos. Como nos sustentamos na vida, como dormimos, como nos exercitamos.

Os fatores mais importantes na elevação de insulina na corrente sanguínea são a ação do cortisol e a presença de glicose proveniente da alimentação. O corpo humano necessita de glicose, mas um corpo saudável é capaz de gerar toda a glicose que necessita. Esta glicose é produzida através de um processo chamado gliconeogênese, onde a glicose é metabolizada a partir de gordura e proteínas do próprio corpo.

Por outro lado, os fatores mais importantes na diminuição dos níveis de insulina no corpo são a atividade física, em menor grau, e a restrição na ingestão de carboidratos, em maior grau. Na atividade física as células dos músculos absorvem rapidamente a glicose disponível no sangue, mesmo sem a ajuda de insulina (7, 8, 9). Os carboidratos ingeridos, por sua vez, são processados e liberados para a corrente sanguínea pelo fígado.

Como anteriormente citado, insulina é um hormônio anabólico. Quando presente em níveis elevados no sangue, impede que sejam desmontadas as gorduras armazenadas nas células adiposas. Quando em baixos níveis, a insulina é contraposta por vários hormônios catabólicos, sendo o mais importante o glucagon. O glucagon passa para as células em geral, e com mais efeito para as células adiposas, a mensagem para que sejam desmontadas as gorduras armazenadas, para suprir energia para as células, na forma de corpos cetônicos. Nesta condição, também é ativada a produção de glicose através da gliconeogênese. A gliconeogênese ocorre no fígado e rins e evita, portanto, a hipoglicemia.

Se um corpo fica sujeito a uma carga glicêmica muito alta, com muita frequência, o nível de insulina permanece elevado por muito tempo, o que acaba por gerar resistência à insulina (10). Então, ingerir carboidratos em cinco ou seis refeições por dia, não é uma estratégia adequada. Lembre-se: não precisamos ingerir carboidratos.

Chegamos ao mais importante fator no controle da resistência à insulina: o alimento que comemos. É o fator mais poderoso, mas o mais difícil de mudar. Os alimentos que comemos são, geralmente, exatamente a causa dos distúrbios metabólicos! Como escolhemos os alimentos que comemos? Porque estão disponíveis, porque acreditamos que são saudáveis, porque são saborosos, porque nos trazem boas memórias, porque aliviam nossas tensões. São muitas as razões! Um aspecto, entretanto, é muito importante, e deve ser determinante na escolha de nossa alimentação: o que, afinal, pode ser considerado um alimento saudável?

Este é um ponto crucial. É evidente que existem diferentes tipos de resposta a determinados alimentos em determinadas pessoas, mas, em linhas gerais, nós, da espécie Homo Sapiens, temos reações metabólicas semelhantes aos diversos tipos de alimentos que ingerimos. Faz parte de nossa fisiologia, da nossa anatomia, do modo como evoluímos como espécie.

NUTRIÇÃO E SAÚDE

A ciência da Nutrição é relativamente recente e os estudos com os humanos não são simples. Ao contrário de um ensaio com um determinado medicamento, onde pode ser oferecido a um grupo de pacientes um medicamento ou um placebo, num ensaio duplo cego randomizado (padrão ouro na ciência da saúde), é muito difícil de fazê-lo com alimentos, em grandes grupos de pessoas ou por muito tempo. Um ensaio clínico randomizado permite estabelecer, com segurança, relações de causa e efeito. Os ensaios mais aplicados em nutrição são ensaios observacionais ou epidemiológicos, baseados em questionários, que permitem, simplesmente, estabelecer relações de coincidência. Normalmente deixam margem aos mais diferentes tipos de interpretação, muitas vezes erroneamente inocentes, mas, infelizmente, muitas vezes tendenciosas.

A relação entre nutrição e saúde é antiga, entretanto. Os registros de Hipócrates e seus discípulos a evidenciam, tendo sido escritos entre 400 e 300 anos antes de Cristo. Aparentemente, escolhas erradas foram feitas no aconselhamento nutricional no último século, como fartamente documentado por Taubes (11) e Teicholz (12). Ambos os autores mostram em suas obras, que a atual pandemia de obesidade e diabetes tipo 2, é o resultado da distorção parcial da ciência, usada para acomodar interesses políticos, em processo ocorrido nos Estados Unidos entre os anos 1950 e 1975.

Então, deixemos que os alimentos promovam, por si só, as necessárias evidências. Antes necessitamos discorrer um pouco sobre duas linhas de pensamento cuja oposição, por um lado, motivou o desenvolvimento da ciência da nutrição, por outro lado dificultou o entendimento dos processos metabólicos envolvidos na própria nutrição.

Uma destas linhas de pensamento é baseada no balanço calórico, onde se consideram todas as calorias ingeridas nos alimentos como iguais. Nesta linha, se uma pessoa ingerir mais caloria do que gasta, engorda. Se ingere menos calorias do que gasta, emagrece e permanece sensível à insulina.

A segunda linha de pensamento tem uma abordagem metabólica. Considera que as calorias dos alimentos diferem entre si, pois estão associadas a diferentes alimentos, basicamente: gorduras, proteínas e carboidratos. Cada um destes grupos, chamados macronutrientes, ao ser digerido, afeta de modo diferente os hormônios do corpo, principalmente a insulina. É o subsequente efeito da insulina que provoca a resistência à insulina, o ganho de gordura corporal e eventualmente, a doença. Logo, deste ponto de vista, a nutrição, ou dieta, não é um simples caso de “calorias que entram e calorias que saem”. Esta abordagem é conhecida como teoria hormonal da obesidade. Vejamos, na prática, como cada uma se comporta.

O tipo de intervenção dietética mais frequente, seja para controle de peso, seja para controle da resistência à insulina, é a restrição calórica. Funciona em ambos os aspectos num primeiro momento, de forma mais efetiva para o controle de peso. A medida em que ocorra perda de massa magra, entretanto, o efeito inverso pode acontecer, com elevação da resistência à insulina (13). Apesar de muitos estudos observacionais mostrarem benefícios em dietas hipocalóricas e de baixo teor de gorduras, estudos clínicos, de melhor padrão, não mostram redução de resistência insulínica neste tipo de dietas (14). O que também frequentemente se verifica é que o corpo submetido à restrição calórica, uma vez reduzida parte da gordura acumulada, diminui automaticamente o metabolismo basal, em reduções que chegam a 40% de sua capacidade normal. Aqui devemos lembrar que o corpo gasta energia para: se aquecer, fazer o coração bombear o sangue, manter a pressão arterial, promover o funcionamento cerebral, movimentar-se, digerir os alimentos, repor os tecidos do corpo. Uma vez reduzido o aporte calórico, o corpo automaticamente explora a energia armazenada em gordura, mas, preparando-se para um futuro de restrição, passa a dispensar menos energia em todas as outras funções, que ficam prejudicadas. Existem estudos relevantes, ensaios clínicos de longa duração, com grande número de participantes, que demonstram que as dietas hipocalóricas não são eficazes para redução de peso a longo prazo (15). Isto se dá, exatamente, pela redução metabólica, que é um modo natural do corpo de se proteger contra a falta de alimento. É comum um paciente apresentar peso superior ao inicial tempos depois de passar por uma dieta hipocalórica. É uma dieta impossível de manter por muito tempo, com alta taxa de desistência, por ser estressante, e que mantém baixo o nível do metabolismo basal, mesmo após a interrupção da dieta. Isso justifica o rápido reganho de peso, que é muito comum. É o conhecido efeito sanfona, e é comum observar o crescente ganho de peso a cada tentativa (16). O que é pior, o paciente ainda se sente culpado por isso.

Esta verdade inconveniente, que mostra a falência da teoria do controle calórico, é esquecida porque a grande maioria de nossos médicos, nutricionistas, cientistas, políticos, o governo e a mídia estão alardeando, por décadas, que a perda de peso só tem a ver com “ingestão de calorias versus queima de calorias”, ou “coma menos, mova-se mais” (17). Por este motivo é difícil aceitar, mas a boa ciência mostra que a redução calórica na dieta, e a prática de exercícios para redução de peso, são uma garantia de falha a longo prazo.

O corpo humano possui sistemas extremamente complexos de regulação, regidos pelos hormônios. A característica determinante do corpo é a sua permanente ação para manter os parâmetros vitais em equilíbrio, adaptando-se às mudanças, o que é conhecido por homeostase. O peso corporal é um desses parâmetros de regulação automática e o hormônio insulina é ao mesmo tempo, a referência e um dos agentes nesse controle (17).

Dois hormônios, e somente dois, quando injetados no corpo causam a obesidade. A insulina, de forma direta (18), e o cortisol, de forma indireta (19). O cortisol, hormônio do stress, disponibiliza glicose no sangue, para que o corpo tenha energia imediata para fugir ou lutar. A insulina tem efeito oposto, sinaliza para o corpo acumular. Desempenham papéis opostos no stress de curto prazo. No stress de longo prazo o cortisol cronicamente elevado mantém níveis elevados de glicose, o que acaba aumentando o nível de insulina. Com insulina elevada o corpo entra em estado de armazenar: todo o excesso de glicose é convertido em gorduras (lipogênese de novo) e o desmanche de gorduras é bloqueado. A insulina causa obesidade. Quando a insulina no corpo aumenta, o peso do corpo aumenta. O hipotálamo envia sinais hormonais ao corpo para que ele ganhe peso. Começamos a ter fome, então comemos. Se fizermos propositadamente restrição calórica, o corpo baixa o metabolismo e ainda assim, engordamos. O nível médio de insulina no sangue é que determina se vamos ganhar ou se vamos perder peso. Por que engordamos? Engordamos porque o regulador do peso do nosso corpo está alto. Engordamos porque nossos níveis de insulina estão altos (11). É da nossa natureza.

Como vimos, engordamos por conta dos altos níveis de insulina e, os próprios níveis elevados de insulina provocam a resistência à insulina. Concordando com isso, a solução para evitar ganho de peso e resistência à insulina é evidente: comer menos carboidratos. Ao comer menos carboidratos mantemos a glicose no sangue reduzida, assim como a insulina. Por consequência temos a sensibilidade à insulina melhorada, ou seja, temos a resistência à insulina diminuída. Como resultado evitamos a síndrome metabólica, a obesidade, a diabetes tipo 2 e as doenças crônicas não transmissíveis. Resultado: aumento da expectativa de vida saudável.

Para entender a importância da qualidade do que comemos, basta verificar a influência de cada tipo de alimentos no nível de insulina. A ingestão de proteínas gera uma elevação leve, em torno do dobro da insulina de jejum. Carboidratos geram elevações de insulina maiores que dez vezes o normal. A ingestão de gorduras não eleva a insulina (21).

A restrição de carboidratos talvez tenha sido primeira intervenção dietética moderna documentada para o controle do peso e diabetes. Até a década de 1950, para o controle da diabetes tipo 2 era encorajado evitar o consumo de pães, cereais, açúcar, e de qualquer coisa com amido. Por outro lado, era encorajado o consumo de carne, ovos, queijos e assemelhados (22).

A partir da década de 1950 houve uma mudança radical. Passou a se recomendar exatamente o oposto, sob a liderança da Associação Americana de Cardiologia e com o apoio, até recentemente, da Associação Americana do Diabetes. E a população mundial respondeu: comemos, por pessoa, menos gordura que comíamos até cinquenta anos atrás (23). Também substituímos gordura animal por gordura vegetal extraída de grãos, tudo de acordo com as diretrizes dietéticas emanadas do Departamento de Agricultura do governo dos Estados Unidos, posteriormente incorporadas pela Organização Mundial da Saúde. Estas mudanças deveriam ter nos tornado mais saudáveis e evitar as doenças cardiovasculares. Entretanto, a explosão da obesidade e da resistência à insulina, assim como a manutenção da prevalência das doenças cardiovasculares como aquelas de maior morbidade no mundo, é a evidência que esta mudança de rumo, desviando-se da gordura em favor dos carboidratos, não forneceu os resultados esperados, ao contrário.

A REVISÃO DA NUTRIÇÃO E A PREVENÇÃO DA SAÚDE

Desde a década de 1990 pesquisas clínicas independentes, de bom nível de confiabilidade, têm fornecido evidências de que a restrição de carboidratos previne ou melhora a resistência à insulina e por consequência, as doenças crônicas decorrentes. Estudos de ensaio clínico, com intervenção nutricional e acompanhamento, não estudos observacionais baseados em recordatórios, conseguiram indicar, definitivamente, a melhor dieta para melhorar a resistência à insulina. Lembramos que diminuir resistência à insulina resulta em baixa de peso permanente. Um dos estudos, inclui centenas de pessoas de meia-idade com sobrepeso, homens e mulheres, num estudo de dois anos: uma dieta com baixo teor de gordura e restrição calórica, uma dieta com teor de gordura médio e restrição calórica e uma dieta de baixo carboidrato sem restrição calórica. A dieta de baixo carboidrato sem restrição calórica foi a que maior redução de peso ofereceu, assim como resultou em menores níveis de insulina e mais diminuiu a resistência à insulina (24). Outros estudos confirmam superioridade da dieta de baixo carboidratos em ensaios diferentes (25 a 30). A soma das evidências é tão grande que a própria Associação Americana do Diabetes reviu suas diretrizes em 2019, incluindo a dieta de baixo carboidrato nas ferramentas para o controle do diabetes tipo 2 (31).

É evidente que nem todos os alimentos com carboidratos são iguais em termos de elevação de insulina. Alguns geram rapidamente picos de insulina no sangue (de alto índice glicêmico), enquanto outros mantém a insulina elevada por longo tempo (alta carga glicêmica). Também não se pode afirmar que carboidratos nos fazem mal, porque é seguro afirmar que fazem parte de nossa dieta desde sempre, até onde indicam os estudos antropológicos.

O homem é um ser que dominou o fogo e aprendeu a cozinhar. Diferenciou-se dos demais primatas por comer mais carne e gordura (seguramente), mas não deixou de comer frutas, ou mesmo raízes e grãos coletados eventualmente. Evoluiu para não comer preferencialmente folhas cruas, como os gorilas, ou como optam os chimpanzés, quando não tem outra coisa para comer. Nem está preparado para isso, como se verifica ao avaliar o sistema digestivo do homem. É muito mais parecido com aquele de um cão, carnívoro, do que com aqueles de chimpanzés ou gorilas, frugívoros e vegetarianos.

Até o advento da agricultura, em torno de 12.000 anos atrás, o estudo dos fósseis nos mostra que o homem evoluiu em tamanho e, principalmente, no volume craniano, acomodando um crâneo cada vez maior. Até então o consumo de carboidratos era provavelmente eventual, como mostra o estudo de povos isolados, tanto pelos relatos dos antigos descobridores e cientistas, quanto dos atuais antropólogos (32). Há, então, o conhecimento de grupos cuja alimentação varia do consumo exclusivo de proteína e gordura animal (esquimós) até grupos com consumo elevado de tubérculos, gordura de coco e frutos do mar, como em povos da Oceania. Vale notar que nunca foi encontrado um grupo que se caracterizasse por sobreviver e prosperar, exclusivamente, com alimentos com base vegetal.

Não se pode negar os benefícios resultantes da domesticação dos animais e do advento da agricultura para a humanidade. É evidente que a agricultura disponibilizou maior a acesso aos carboidratos e que estes têm sido integrados nas dietas em diferentes graus, dependendo da disponibilidade, e mesmo da incorporação nas culturas locais. Muitos vegetais, como o milho e a batata, só chegaram na Europa com o intercâmbio com as Américas, onde são nativos e assim por diante. O mesmo ocorreu com o açúcar da cana e uma infinidade de produtos. Por que tudo isso está sendo colocado? Para dizer que os carboidratos, em si, não são o problema. O problema é como são consumidos, em que quantidade e com que frequência.

Como anteriormente citamos, até a década de 1950 havia um entendimento sobre o risco do consumo excessivo de carboidratos, que era a obesidade e o diabetes tipo 2. Vale lembrar que casos de diabetes tipo 2 eram raríssimos no início do século XX e foram aumentando de forma preocupante na primeira metade deste período. Coincidentemente, as doenças cardiovasculares, não eram relevantes no início dos anos 1900. Na tentativa de resolver a rápida elevação das doenças cardiovasculares, que vitimavam cada vez mais norte-americanos, alguns cientistas propuseram na década de 1950, a hipótese dieta-coração. Esta hipótese propunha que o consumo de gordura saturada de origem animal seria a responsável pelo crescimento das doenças cardiovasculares. Apesar de fortemente questionada no meio científico, resultou na emissão de recomendações dietéticas que propuseram o aumento do consumo de carboidratos em detrimento do consumo de gorduras, assim como a substituição das gorduras saturadas de origem animal por gorduras não saturadas de origem vegetal. Dietas de baixo teor de gordura, elevado teor de carboidratos. Daí saíram as conhecidas pirâmides alimentares, tendo na base os carboidratos, e a recomendação do maior particionamento das refeições, sugerindo a adoção de cinco a seis refeições por dia. Sobre o resultado, já discorremos: um desastre. Também sabemos o motivo: muito carboidrato, com muita frequência, altos níveis de glicose no sangue, resistência à insulina, obesidade, diabetes e consequências (11, 12).

As recomendações oficializadas a partir da década de 1970, baseadas em hipóteses não comprovadas, resultou na formação de inúmeros profissionais da saúde que pautam seu trabalho nestas recomendações. Vai demorar muito para que este problema seja reconhecido e finalmente revisado nas escolas. Entretanto, é dever do profissional esclarecido, a todo momento, se manter atualizado com o desenvolvimento da ciência em sua área de atividade e tratar de revisar sua conduta profissional pautado neste desenvolvimento.

Como é normal no progresso da ciência, a avaliação da impactação do excesso de carboidratos na dieta, permitiu o surgimento de novos conhecimentos, que podem auxiliar na manutenção e melhoria da saúde, aumentando a expectativa de vida saudável. Estes seriam benefícios suplementares prováveis de serem obtidos ao serem adotas dietas com baixo ou zero carboidrato: controle natural do peso (5), a diminuição dos fatores de risco das doenças cardiovasculares e mesmo a revisão destes fatores (33), o controle da pressão sanguínea (34), a saúde do sistema reprodutivo (35, 36), a saúde do sistema neurológico (37) incluindo Alzheimer (38) e Parkinson (39, 40), o controle das enxaquecas (41), a saúde da pele (42), o controle de problemas como azia(43), o controle de alguns tipos de câncer (44) e perspectivas para interferência positiva no processo de envelhecimento (5, 45).

CONCLUSÃO

Ao se avaliar a saúde de um paciente devem ser investigados parâmetros que possam ser assumidos como índices de saúde. É evidente que devem ser procurados indicadores de anormalidades agudas, como infecções ou parasitose, assim como os indicadores de anormalidades funcionais como visão e audição. Entretanto, quanto mais precoce e intensiva a busca de indicadores de risco para a Síndrome Metabólica, entre eles a resistência à insulina, maiores as chances de serem propostas medidas corretivas, que irão postergar ou mesmo evitar o surgimento das Doenças Crônicas Não Transmissíveis.

Felizmente, para a grande maioria das pessoas, estas medidas se limitam a mudanças no estilo de vida, sempre difíceis, porém viáveis, desde que acertadamente informadas, incentivadas e acompanhadas.

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